Maldades da reforma de Bolsonaro são parte da destruição do bem-estar social

Diante do anúncio da “reforma” da Previdência do governo de Jair Bolsonaro, todos querem saber: como vai ficar minha aposentadoria? O economista Fausto Augusto Júnior, coordenador de Educação do Dieese, afirma que os trabalhadores não devem ficar ansiosos, já que, seguindo o rito legal, a proposta deve tramitar por no mínimo seis meses entre a Câmara dos Deputados e o Senado.

 

“Tudo vai depender da combinação de forças no Congresso Nacional e a capacidade de reação dos trabalhadores”, afirma o economista, ressaltando a importância de construir a resistência.

 

“Porque a questão não é só a aposentadoria do trabalhador, o que já seria muita coisa. Mas essa reforma trata de um processo de mudança do Estado democrático de direito no país”, avisa. “Temos de fazer esse debate sobre que projeto de sociedade a gente quer, de visão de Brasil.”

 

Para o técnico do Dieese, o mundo ainda está no meio da superação da crise de 2008. “E uma nova crise se aproxima. Neste contexto, o Brasil já não tem mais nenhuma editora de livro didático, num país onde o Fundeb (fundo para educação básica) gira em torno de R$ 150 bilhões. Onde o sistema público de saúde movimenta R$ 170 bilhões. O SUS é o maior comprador do mundo e o Brasil era um dos três países que não colocava saúde como mercadoria”, lembra. “Essa reforma da Previdência é uma parte desse movimento muito maior, um processo de desconstrução do pequeno estado de bem-estar social que foi construído desde 1988.”

 

Fausto explica a lógica do sistema em questão: a tese é de tudo que é publico é ruim, tem de privatizar. “O objetivo é criar um enorme mercado de previdência no Brasil. Todo mundo vai ter garantido mil reais e quem quiser mais vai procurar um PGBL e VGBL da vida”, avalia. “É uma mudança estrutural que altera o que será o Brasil daqui a 50 anos. Uma grande mudança constitucional que nenhum governo deveria estar autorizado a fazer.”

 

A “crueldade” das principais mudanças

 

As atuais alíquotas de contribuição de 8% a 11% vão passar para 7,5% a 14%.

 

Acaba a aposentadoria por tempo de contribuição e a regra única será a idade mínima (65 e 62).

 

Tempo mínimo de contribuição passa de 15 anos para 20 anos para aposentar, em média, com o valor de um salário mínimo.

 

“Trabalhadores da construção civil não conseguem nem 15 anos. E não há emprego para a idade de 65 anos. Para chegar ao teto do benefício serão necessários 40 anos de contribuição”, critica Fausto.

 

A regra de cálculo vai levar em conta todas as contribuições. Ou seja, se a proposta passar, será o fim do expurgo dos menores salários (atualmente leva-se em conta as 80% melhores).

 

A proposta prevê que, para quem se aposentar pelo tempo mínimo de 20 anos de contribuição, calcula-se a média dos salários de todos esses 20 anos e paga-se ao aposentado 60% dessa média. Para cada ano a mais de contribuição, acrescenta-se mais 2% (assim, se chegar aos 40 anos de contribuição, o aposentado receberá 100% da média de todos esses 40 anos).

 

Ou seja, atingir o teto será muito difícil. E a aposentadoria por doença também seguirá essa lógica.

 

O valor da pensão por morte vai cair para 60% do salário de contribuição mais 10% por dependente.

 

A principal maldade, no entanto, segundo Fausto, está no Benefício de Prestação Continuada (BPC). Pago a idosos em famílias acima de quatro pessoas que tenham renda de até um salário mínimo, terá o valor reduzido para R$ 400 para quem tiver a partir de 60 anos. Somente aos 70 anos o idoso, que sobreviver a tanta penúria, terá o direito de receber um salário mínimo.

 

E tem mais um agravante na proposta do governo Bolsonaro: se o idoso tiver uma casa de R$ 98 mil, significa que tem patrimônio o suficiente para não merecer o BPC e perderá o direito.

 

“O governo quer convencer que o velhinho que trabalhou a vida inteira, ou o carente que recebe um salário mínimo para sobreviver são os problemas. Mas a parte maior do orçamento da União vai para pagar aos bancos os juros da dívida pública. Dinheiro que acaba indo para fora do Brasil”, afirma o economista.

 

“O dinheiro da Previdência fica no mercado interno pagando aluguel, alimentação, medicamento. E o governo quer dizer que problema é esse idoso e não o outro? Ambos pagam o mesmo imposto, é absolutamente injusto. É muito bom ser rico no Brasil. Nem nos EUA é assim.”

 

A proposta de Bolsonaro acaba ainda com o direito à multa de 40% para demissão de trabalhadores aposentados. E extingue a contribuição ao INSS do trabalhador aposentado.

 

No fim das contas, o sistema público será totalmente fragilizado. “Fazer reforma da Previdência deveria tirar dos que ganham mais para pagar a quem ganha menos. Mas nessa proposta não mexem em quem ganha mais para ferrar quem ganha menos.”

 

Fonte: RBA

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